terça-feira, 18 de junho de 2013

A Marca como Passaporte para a Cidadania Global: uma Análise Comparativa

MORAES, S.G; STREHLAU, V. I.; ROCHA, T. V A Marca como Passaporte para a Cidadania Global: uma Análise Comparativa. V Encontro de Estudos em Estratégia, 15 a 17 de maio de 2011, Porto Alegre/RS. Anais... V 3Es, ANPAD.

2. Referencial teórico e construção das hipóteses

A globalização dos mercados colocou as marcas globais no centro do palco, exercendo seu
poder e influência sobre vários domínios no horizonte do consumidor: econômico,
psicológico e cultural (OZSOMER, ALTARAS, 2008). Marca global é aquela que tem,
muitos aspectos similares, como posicionamento, estratégia de propaganda, personalidade,
visual, e gera sentimentos parecidos nos países em que atua (AAKER, JOACHIMSTHALER,
1995).
No entanto, de nada adianta a empresa detentora da marca considerá-la, internamente, como
global se ela não for percebida pelo consumidor como tal. Essa percepção só será formada se
o consumidor acreditar que a marca é comercializada em múltiplos países, e reconhecida
neles como sendo global (STEENKAMP, RAJEEV, ALDEN, 2003).
A marca se beneficia quando o consumidor reconhece sua globalidade, aumentando seu nível
de estima e apreciação (JOHANSON, RONKAINEN, 2005). Um dos caminhos para a
construção dessa preferência por marcas globais é a sensação de pertencimento que essas
marcas oferecem, permitindo ao consumidor se sentir como que fazendo parte de uma cultura
global de consumo (ALDEN, STEENKAMP, BATRA, 1999). Se, por um lado, as marcas
globais transportam os valores da cultura global, por outro, os consumidores criam e
adicionam novos significados às marcas globais por meio de um processo de significação e
re-criação, permitindo a criação de uma identidade, um sentimento de realização e
identificação para os consumidores (OZSOMER, ALTARAS, 2008). Os consumidores
compartilham com seus semelhantes uma identidade global idealizada, apoiada pela imagem
percebida das marcas globais - a cidadania global (STRIZHAKOVA, CULTER, PRICE
2008). Assim, os consumidores jovens que têm uma crença forte na cidadania global darão
maior ênfase e estarão mais envolvidos com as marcas em suas práticas de consumo.
H1: A crença na cidadania global tem um efeito positivo na importância que o
consumidor dá a marcas entre os universitários de São Paulo.
Os padrões de comportamento de marcas locais ou globais são influenciados fortemente por
dois constructos, o etnocentrismo do consumidor e a abertura cultural.
Etnocentrismo representa as crenças do consumidor sobre a adequação, ou mesmo
moralidade, da compra de produtos estrangeiros (SHIMP, SHARMA, 1987).
Abertura cultural está ligada à afetividade, hedonismo, e valores mais simbólicos das marcas,
e é definida como o interesse que os indivíduos têm em pessoas, valores e culturas
estrangeiras, bem como, experiências que tenham compartilhado nesses ambientes, não sendo
especificamente relacionada ao consumo de produtos e serviços estrangeiros versus locais
(SHARMA, SHIMP, SHIN, 1995).
Algumas pesquisas nos Estados Unidos indicaram que o etnocentrismo está negativamente
relacionado com a abertura cultural (SHARMA, SHIMP, SHIN, 1995), e outras pesquisas
constataram que o nacionalismo econômico (intimamente associado ao etnocentrismo)
também está negativamente relacionado com a abertura cultural (BAUGHN, YAPRAK,
1996). Alguns autores, no entanto, criticam essa visão que estaria baseada mais no senso
comum, que diz que quanto mais interações culturais e oportunidades de viagem maior será a
abertura cultural do consumidor, e menos no etnocentrismo. Skinner (apud
SHANKARMAHESH, 2006) afirma que grupos com maior grau de contato com culturas
diversas, como habitantes de fronteiras, viajantes e diplomatas tenderiam a ser mais
etnocêntricos e nacionalistas. Para efeito deste estudo, porém, será esperado um
comportamento mais semelhante àquele apontado em pesquisas conduzidas nos EUA, devido
a sua influencia cultural no mercado estudado.
H2: O etnocentrismo do consumidor e sua abertura cultural são negativamente
correlacionados entre os universitários de São Paulo.
O constructo abertura cultural foi validado por Sharma, Shimp e Shin (1995), em estudos
realizados nos Estados Unidos. A abertura (a experiências) é um dos cinco traços de
personalidade, e tem sido associada a valores como afetividade e lealdade a marcas, na
medida em que indivíduos com maior escore em abertura (a experiências) são mais curiosos
sobre o seu mundo interior e também sobre o mundo exterior, propensos a abraçar novas
idéias e valores não convencionais (MATZLER, BIDMON, GRABNER-KRAUTER, 2006).
Esses indivíduos mais abertos se percebem como menos provincianos e mais competentes ao
lidar com culturas estrangeiras, especialmente com a cultura global emergente, que é um
fenômeno que passa por rápidas e drásticas mudanças, resultado da crescente
interconectividade das várias culturas locais desde a Segunda Guerra Mundial. Esse grupo,
formado por perfis como adolescentes, executivos, diplomatas, etc., tem uma auto-imagem de
cosmopolitas, inteligentes e modernos (HANNERZ, 1990). Essas pessoas mais abertas ao
aprendizado de culturas estrangeiras e ao compartilhamento de valores estariam mais
propensas a crer que as marcas globais podem prover um espaço para discussão e participação
no mercado global.
H3: Abertura cultural tem um efeito positivo na crença na cidadania global entre os
universitários de São Paulo.
Strizhakova, Culter e Price (2008) comparam, em seu estudo, o efeito do etnocentrismo entre
países desenvolvidos e em desenvolvimento, testando se nos primeiros o efeito positivo sobre
a crença na cidadania global seria maior do que nos últimos. Na réplica, não é possível fazer
algum tipo de comparação, mas é necessário testar o efeito do etnocentrismo, fundamental
para a análise geral das causas da preferência por marcas.
Segundo Strehlau, Loebel e Ponchio (2009) foram encontradas relações entre etnocentrismo
do consumidor da cidade de São Paulo e classe socioeconômica, confirmando a existência de
uma correlação negativa entre renda e etnocentrismo, pois conforme a renda aumenta,
aumentariam também as possibilidades de viagem e do desenvolvimento de um maior
cosmopolitanismo, o que levaria a uma diminuição das tendências etnocêntricas (SHARMA,
SHIMP e SHIN, 1995). Strehlau, Loebel e Ponchio (2009) também encontraram relações
entre etnocentrismo e idade, em consonância com o argumento de que a relação positiva entre
idade e as tendências etnocêntricas do consumidor baseia-se no crescente cosmopolitanismo
de anos recentes e na influência nos padrões de crenças dos jovens (BALABANIS,
MUELLER, MELEWAR, 2002). Assim, como o presente estudo trata de jovens
universitários de alto poder aquisitivo, espera-se que seja detectado um baixo etnocentrismo,
e, por conseqüência, uma alta crença na cidadania global.
H4: O etnocentrismo do consumidor tem um efeito negativo na crença na cidadania
global entre os universitários de São Paulo.
Estas hipóteses formuladas serão testadas na parte empírica do trabalho.

4.1. Discussão dos resultados comparativos
Neste item é apresentada uma análise comparativa dos resultados do modelo aplicado a
estudantes brasileiros com dados obtidos por Strizhakova, Coulter, Price (2008), com
estudantes norte-americanos, romenos, ucranianos e russos, como mostra a tabela 7.
A análise das cargas fatoriais mostra os estudantes brasileiros mais próximos daqueles da
Europa Oriental do que dos americanos no constructo etnocentrismo. Porém, para todos os
construtos, os estudantes brasileiros possuem uma carga fatorial menor, indicando que estes
são menos etnocêntricos do que os estudantes americanos pesquisados.
Por outro lado, essas cargas menores podem também sugerir alguma variação no conceito de
etnocentrismo ou na aplicação da escala de medição do etnocentrismo (CETSCALE). Apesar
desta escala ter sido validada para vários países como Estados Unidos, Alemanha, França e
Japão (NETEMAYER, DURVASULA, LICHTENSTEIN, 1991), Rússia (DURVASULA et
al. 1997), Suécia e Japão (HULT et al. 1999), China e Rússia (KLEIN, ETTENSON,
KRISHNAN, 2006) e Espanha (LUQUE-MARTINEZ et al., 1998), algumas questões são
levantadas quanto à unidimensionalidade do conceito e a necessidade de tratá-lo com certas
nuances, como na Índia (BAWA, 2004), onde variáveis sócio-demográficas não explicariam
adequadamente o fenômeno do etnocentrismo.

Na Tabela 7, para os outros dois constructos a semelhança com os países em desenvolvimento 
é bem menos patente, tendo apenas um item da escala em cada constructo com pontuação 
próximo para as cargas fatoriais, e a diferença em relação aos Estados Unidos se acentua. Os 
brasileiros se apresentam, nesse comparativo, como diferenciados dos dois outros grupos.
Ao se comparar as médias em cada constructo entre os países, como mostra a Tabela 8,
percebe-se o baixo etnocentrismo dos brasileiros e a alta abertura cultural. Os autores não
informaram os desvios relativos às médias obtidas nos outros países, o que impossibilita a
comparação de médias. Eles afirmam, no entanto, que as médias dos EUA e dos outros países
foram significativamente diferentes.

Esta alta média dos brasileiros em abertura cultural pode ser explicada pelas altas freqüências
na amostra de viagens a lazer (84%) e de intercâmbios estudantis (46%). A abertura, no
entanto, não resulta em maior crença na cidadania global. Os jovens brasileiros têm interesse14
em pessoas, valores e culturas estrangeiros, bem como experiências em ambientes no exterior,
mas parecem isolados, não se posicionando como cidadãos do mundo.
A comparação entre as estimativas que dão suporte às hipóteses para os EUA, países em
desenvolvimento e Brasil podem ser vistas na Figura 5.

Na Figura 5, pode-se perceber a maior similaridade do Brasil com os países em
desenvolvimento, ou emergentes. As relações entre etnocentrismo e abertura cultural, e entre
abertura cultural e crença na cidadania global apresentam estimativas bastante parecidas (-
0.01 x - 0.02, e 0.16 x 0.18, respectivamente). O interesse em conhecer lugares, valores e de
interagir com pessoas (abertura cultural) parece ser mais forte no Brasil (média de 5.77) e na
Romênia, Ucrânia e Rússia (média de 4.56) do que nos Estados Unidos (média de 4.27), mas
essa abertura não repercute na crença na cidadania global. Ao contrário, é nos Estados Unidos
que a abertura cultural, mesmo com menor média, mais impacta na crença na cidadania global
(estimativa de 0.68). Por exemplo, o Facebook, líder mundial (e nos Estados Unidos) é o mais
acessado apenas na Romênia, dentro do grupo de países “emergentes”. No Brasil, o líder é o
Orkut e na Rússia e Ucrânia a liderança pertence ao V Kontakte (ВКонтакте) (COSENZA,
2010).

5. Considerações finais
Pela análise descritiva das médias obtidas nos questionários preenchidos, percebe-se que 
jovens brasileiros de classe A/B, da cidade de São Paulo, tendem a ter baixo etnocentrismo, e 
alta abertura cultural. Este resultado aponta uma relação negativa entre etnocentrismo e 
abertura cultural, pontuada em estudos conduzidos nos Estados Unidos (SHARMA, SHIMP, 
SHIN, 1995; BAUGHN, YAPRAK, 1996). Esse comportamento aproxima os jovens 
brasileiros mais dos norte-americanos do que daqueles de países em desenvolvimento
pesquisados em outros estudos.
Por outro lado, os jovens paulistanos de classe A/B são pouco etnocêntricos, mas conforme 
aumenta esse etnocentrismo, aumenta também sua crença na cidadania global. Esse resultado 
aparentemente paradoxal talvez confirme a afirmação de Troiano (1997) de que os jovens 
brasileiros mantém a chamada “personalidade brasileira” e o amor pelo Brasil, enquanto 
combinam novas atitudes, preferências e valores globais. Para a amostra pesquisada, a
abertura cultural tem um efeito positivo sobre a crença na cidadania global, e esta, por sua 
vez, causa certo impacto na preferência por marcas.
Esta alta média dos brasileiros em abertura cultural pode ser explicada pelas altas freqüências 
na amostra de viagens a lazer (84%) e de intercâmbios estudantis (46%). A abertura, no 
entanto, não resulta em maior crença na cidadania global. Os jovens brasileiros têm interesse 
em pessoas, valores e culturas estrangeiros, bem como experiências em ambientes no exterior, 
mas parecem isolados, não se posicionando como cidadãos do mundo.
Um exemplo desse comportamento “isolado” pode ser visto na difusão das redes sociais da 
Internet no Brasil. O Orkut, do Google, tem 52 milhões de usuários no Brasil, enquanto o 
Facebook possui 6 milhões. No mundo, a posição é inversa: o Facebook conta com mais de 
500 milhões de usuários, e o Orkut 85 milhões. Na Índia, por exemplo, o segundo país em 
número de usuários da rede social do Google, o Facebook atingiu a liderança apenas no 
último mês de julho (AGUIARI, 2010).
Como limitações deste estudo, destaca-se que a amostra foi obtida por conveniência, não 
podendo-se generalizar os resultados para toda população. Como contribuições, o estudo 
testa escalas para medir os construtos: etnocentrismo, abertura cultural e crença em cidadania 
global. Além de apresentar uma análise comparativa com a realidade de outros países e outros 
estudos.


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